Coringa, literalmente um delírio a dois...
A palavra vem do latim, "delirium", uma ausência de consciência, saída da realidade ou grande convicção em uma crença.
É visto como um sintoma em alguns transtornos mentais, como a esquizofrenia e mais leve nos casos de bipolaridade.
O enigmático riso de Coringa existe desde "O Homem que Ri" de Vitor Hugo, também me lembra passagens do livro de Milan Kundera, “O Livro do Riso e do Esquecimento” (1979).
Lá, Kundera nos traz o termo "Litost", aquele ódio que aparece quando descobrimos nossa própria miséria.
O personagem do Coringa nasce como uma vingança, um espetáculo da inferioridade.
Toda a sociedade espera o Coringa de Arthur Fleck, existe um fetiche, uma fantasia das pessoas por mafiosos, serial killers, muitos recebem cartas de fãs. Uma compensação inconsciente de poder, assim como Gaga, fazendo Lee, amei o nome, que é apaixonada pelo personagem... Já cantava Lulu Santos: "Não leve o personagem pra cama, pode acabar sendo fatal..."
Quem já não vivenciou isso? Aquela paixão por uma idealização?
Muitos na platéia do cinema estavam eufóricos para verem alí cenas de violência. Queriam o pior de Coringa.
Mas, Todd Phillips quis explorar Arthur, suas vulnerabilidades e isso traz o encontro do expectador com sua própria fragilidade e sensibilidade. Nem todos estão preparados para esse encontro, não é?
As músicas são maravilhosas, tive um momento de muita emoção, com Gaga cantando "Close To You" dos Carpenters, música que minha mãe cantava para mim, nos encontramos sempre na música, é nosso meio de comunicação entre dimensões.
“A luta do homem contra o poder é a luta da memória contra o esquecimento”. (Kundera)
Quem somos nós? A imagem refletida no espelho ou nosso reflexo no olhar do outro?
Um filme mais maduro, profundo, para quem estiver disposto a se abrir para arte, para um delírio musical com direito até a sapateado, que cena aquela...
Deixe suas expectativas para fora da sala do cinema e permita-se mergulhar na arte.