Gente que livro pesado e ao mesmo tempo lindo. Terminei de ler com o coração apertado, mas também com uma sensação de admiração de como o autor, Marcelo, conduz a história da sua família e, principalmente, da relação com a mãe, Eunice. É um livro que mexe com você porque não é só sobre perdas, memória ou ditadura – é sobre viver sobrevivendo a tudo isso.
O ponto alto do livro é a construção dessa dualidade entre passado e presente na vida de Eunice, que vai da força absurda dela como mulher, mãe e advogada até o declínio causado pelo Alzheimer. O Marcelo consegue descrever essa transição sem cair no lado sentimental ou no exagero dramático. Ele fala cruamente das dificuldades de conviver com alguém que está aos poucos se apagando, mas também traz momentos leves e até engraçados. Tipo quando ele diz que aprendeu a rir das reclamações dela chamando tudo de “por-ca-ri-a”. Isso é genial porque mostra como a família tenta lidar com algo tão devastador usando humor e paciência.
Acho que o grande trunfo do livro é como ele aborda a memória. Não só a falta dela, mas como as lembranças moldam quem somos e continuam presentes, mesmo quando a mente começa a falhar. Uma parte que me marcou muito foi quando ele fala sobre a mãe pegando a mão dele para alongá-la, mesmo já bem avançada na doença. É como se aquele gesto fosse mais forte do que qualquer palavra. 😢
Outro ponto forte é a forma como Marcelo conecta a tragédia pessoal da família com o contexto político do Brasil. A prisão e morte do pai, Rubens Paiva, durante a ditadura dá um peso enorme à narrativa. Ele não joga isso na nossa cara como um panfleto político; pelo contrário, é sutil e dolorosamente humano. Você sente a dor de uma família que nunca teve respostas, que viveu anos na incerteza, mas seguiu em frente. Eunice, especialmente, é retratada como uma mulher incrível que, apesar de tudo, continuou lutando pelos direitos humanos e criando os filhos praticamente sozinha.
Os personagens são bem construídos, mas o foco maior é mesmo na figura materna. Ela não é idealizada – longe disso. O autor deixa claro que ela tinha defeitos, era rigorosa, às vezes distante e até birrenta. Mas é justamente isso que torna a história tão real. Você não vê uma mãe perfeita, você vê uma mãe . Alguém que errou, acertou, amou e sobreviveu.
Acho que o grande aprendizado do livro é entender que a gente não controla muita coisa na vida. Nem a memória, nem o destino, nem o país onde a gente nasce. Mas ainda assim seguimos tentando fazer sentido disso tudo, reconstruindo pedaços do que ficou pelo caminho. Eunice fez isso várias vezes ao longo da vida – depois da morte do marido, durante a criação dos filhos, enfrentando a ditadura e, finalmente, aceitando a própria doença.
Dou 5 estrelas! Esse livro é necessário. Ele nos faz refletir sobre coisas que a gente prefere evitar: a fragilidade da mente, a inevitabilidade da morte e a importância de lembrar (e honrar) quem viemos. Recomendo demais.