Os quatro volumes da tetralogia "A Amiga Genial", de Helena Ferrante, são como joias literárias de raro fulgor, cuja tessitura narrativa enleia o leitor em uma intricada rede de memórias, afetos e dissensões, à semelhança de um bordado feito com agulha de fio d'ouro, entremeado com a mais fina seda da prosa moderna.
Na primeira obra, que leva o mesmo título da coletânea, somos apresentados a Lila e Elena, duas almas cuja relação transborda os estreitos limites de uma amizade ordinária. Lila, com sua astúcia quase sobrenatural, e Elena, com sua ânsia por superação, erigem-se como colossos sobre as bases de uma Nápoles imortal, mas ao mesmo tempo esfacelada por suas próprias cicatrizes sociais e morais. A linguagem, ao mesmo tempo prolífica e elegante, nos conduz como em um rio caudaloso, à mercê dos ímpetos e dos revezes das personagens.
O segundo volume, "História do Novo Sobrenome", é um espelho onde se vislumbram as transformações inexoráveis da juventude à idade adulta. O contraste entre o brilho da ascensão social e o torpor das frustrações pessoais é pintado com a tinta da melancolia e do desencanto, e Ferrante, com sua pena arguta, desvenda as profundezas de uma Itália em mutação, sem, contudo, perder de vista a intimidade corrosiva e pungente das protagonistas.
Já em "História de Quem Foge e de Quem Fica", o leitor encontra-se diante de um quadro trágico de rupturas, onde os laços que outrora uniam Lila e Elena se desintegram nas chamas da ambição e do ressentimento. A autora, com uma perícia de ourives, faz cintilar o paradoxo entre a busca de uma identidade própria e a sombra perene do passado, que nunca cessa de rondar as decisões e os destinos de ambas. Aqui, a prosa toma contornos quase filosóficos, indagando a natureza do sucesso e da liberdade, sempre com um pé ancorado no mundo dos comuns.
Finalmente, em "História da Menina Perdida", Helena Ferrante entrega ao leitor uma obra de desfecho apoteótico, onde todas as feridas são reabertas e onde o tempo, implacável, erode até mesmo as mais robustas fortalezas da alma. A perda, a renúncia, a angústia existencial — tudo se condensa nas derradeiras páginas, como se a própria Nápoles, sempre presente como um personagem taciturno, participasse da queda e da redenção de suas filhas. Aqui, a linguagem torna-se quase litúrgica, e a tragédia humana, por vezes, confunde-se com um desígnio divino, inescapável e inexorável.
Em suma, Ferrante, com sua prosa poderosa e estilisticamente refinada, não apenas nos revela as camadas complexas das relações humanas, mas o faz com uma erudição e um vigor dignos de um bardo dos tempos clássicos. A tetralogia "A Amiga Genial" é, pois, uma obra magna, destinada a ecoar pelos anais da literatura como um testamento da condição humana em toda a sua glória e miséria.